sábado, 26 de novembro de 2011

A PERERECA E O SAPO-BOI



A lagoa estava em festa. The Three Cururu Boys, a banda metaleira, formada pelos roqueiros: sapo-boi, sapo-cururu e o sapo-tanoeiro tirou a tarde para passar o som que, com certeza, bombaria no show àquela noite.

A Rádio Lagoa PRH2O, operando em ondas curtas (ainda que lagoa não tenha ondas), não se cansava de tecer elogios à banda e de anunciar a grande performance dos tão badalados roqueiros, primeiro lugar no hit parade, com o rock pesado: “OS SAPOS”. Na verdade, um arranjo musical do poema de Manoel Bandeira, um sapinho brasileiro, moderninho como os metaleiros. 

- Hello crazy people! – Saudava e anunciava, frenético, o batráquio locutor da PRH2O, uma espécie de Big Boy da Lagoa, apaixonadaço por rock and roll. - A lagoa vai tremer! The Three Cururu Boys vão mandar ver! Vai ter tsuname na lagoa!

Jias, rãs, pererecas, enfim, toda comunidade feminina dos anfíbios, em clima de festa, empererequetava-se no único salão de beleza local, para impressionar a sapaiada, ficar e beijar muuuuinto!

Porém nem tudo era alegria naquele dia. Na casa de Zitinha Perereca, por exemplo, estava o maior baixo-astral. É que ela estava de cama, por conta de uma febre e um resfriado inoportunos. Por mais que implorasse à mãe, para ir ao show, esta, irredutível, proibira-lhe de sair de casa à noite, a fim de evitar a friagem, para não agravar mais o seu estado de saúde. 

- Deixa, mamãe, tomo cuidado! Ponho agasalho! – Insistia Zitinha.

- Não e não, Zita! Não insista! Febre e resfriado, é como diz o ditado: vitamina C, e cama! Trate de deitar-se e dormir.

Zitinha não podia crer no que estava acontecendo. Passara o ano inteiro nutrindo o sonho de assistir, ao vivo, ao show da banda que mais curtia. Não só porque adorasse suas músicas, fosse apaixonada por rock, mas, principalmente, porque tinha uma quedinha pelo vocalista da banda, o sapo-boi. 

Zitinha não se conformava. Agora que estava tão perto de realizar seu grande sonho: assistir ao vivo e a cores os seus ídolos; sem contar a possibilidade de abrir seu coração e declarar a sua paixão pelo irresistível bad boy sapo-boi, estava acontecendo àquela tragédia. Era difícil acreditar que uma febrezinha e um resfriadinho de nada estivessem a ponto de mergulhar seus sonhos água abaixo... Mas estavam. Não é justo! – Lamentava-se, não é justo!

O sapo-boi, que era todo pomposo, soberbo e orgulhoso, tipo Mané-gostoso, e que tinha fama de zoar das garotas que não faziam o seu tipo, ao ficar sabendo pelas outras garotas que a Perereca Zita arrastava uma asinha por ele, não se fez de rogado, abriu a bocarra, em estrondosa gargalhada, e desdenhou:

- Não faz meu tipo! É muito patricinha! Eu só gosto de perereca levada da breca! Xô, perereca baixinha!

Quando a noite chegou, a saparia coaxou na lagoa fria; que logo esquentou, ferveu qual panela de pressão em assovios, bis e muita azaração, que rolou de montão com a zoeira do sonzão. 

Dia seguinte, tardezinha, ainda com a lagoa se refazendo da ressaca do sonzão, Zitinha, já restabelecida do mal que a havia cometido, saiu para o seu passeio vespertino, como era costume na lagoa. Para surpresa sua, deu de cara com o sapo-boi, sujeitinho paroleiro, barulhento, tipo sapo-tanoeiro. Seu coraçãozinho danou a pular, como se quisesse sair pela boca e ir se enroscar no sapo babão, metido a gostosão.

O anfíbio mau caráter, ao ver a perereca, não perdeu a oportunidade de zoar; empunhou a guitarra, fez aquela pose de pompudo, que só os cantores metidos sabem fazer, e Pôr-se a coaxar:

Eu sou o sapo-boi,
A perereca foi
À festa? Foi?
Não foi!

Zitinha voltou para casa deprimida com a atitude do sapo babão. Desde então, não mais saía à noitinha, para passear, porque o bad-frog, mal escurecia, escancarava a bocarra e encasquetava a coaxar:

Eu sou o sapo-boi,
A perereca foi
À festa? Foi?
Não foi!

Um dia, a Rã Zinza, uma priminha em primeiro grau de Zita, veio visitá-la. Zinza tinha fama de mal humorada. Era do tipo não leva desaforo pra casa. O que tinha de dizer dizia na lata. Zita abriu o coração para a prima. Contou-lhe tim-tim por tim-tim como o sapo-boi a maltratava, a ponto de estraçalhar o seu desiludido coração. Zinza compartilhou o sofrimento da prima, a ponto de não conter a ira que sentia ante àquela situação. Tudo por culpa daquele sapo-boi boca-de-caçapa, sem um pingo de amor no coração.

- Fica assim, não, prima! Desencana! Aquele paroleiro não te merece! Se você não foi ao show, não perdeu nada! Se tivesse ido, tinha ficado decepcionada com aquele sapo-boi desafinado, e ainda por cima, metido em um shortinho de bolinha que mais parecia uma cuequinha. Ri-dí-cu-lo! Precisava ver!

- Prima do céu! – exclamou Zitinha. - Você acabou de me dá uma idéia maior legal, para me livrar daquele sapo malvado!

- Que idéia, prima?

- Me aguarde!

Tarde seguinte, tão logo o sol desceu o imenso tobogã celeste e desapareceu rumo ao Oriente, Zitinha pulou para a pracinha da lagoa, camuflou-se entre a folhagem das plantas aquáticas, esquentou a voz fina e estridente com o rac-rac-rac característico das pererecas, e ficou tocaiando o sapo-boi. Assim que este apareceu, ela começou a cantar:

Eu sou Zitinha perereca,
O sapo-boi foi
À festa? Foi?
Mas só de cueca!

O sujeitinho à-toa, tipo anuro metido, vulgo sapo sem rabo, com o orgulho ferido e desmoralizado com a cantoria da Zitinha Perereca, meteu a soberba no papo e a guitarra no saco e foi-se a escoachar em outra freguesia, ou melhor, em outra lagoa. 

Reinaldo Braz dos Santos

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